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Se não é pela vida, pense no dinheiro: temos que descriminalizar o aborto

  • Foto do escritor: Leonardo Oberherr
    Leonardo Oberherr
  • 25 de set. de 2021
  • 3 min de leitura

Texto escrito em 2021 para a disciplina de Jornalismo Opinativo.


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Confesso que escrever sobre um assunto tão delicado me deixa desconfortável. Tudo o que posso imaginar sobre o tema “aborto” é apenas no campo hipotético, imaginativo, até porque nunca precisarei tornar em perspectiva se irei ou não fazer um aborto, pois, pessoalmente - como homem - não posso gerar um bebê. É mais fácil.


Quero me desprender dos achismos, do lugar comum, porém, se são tão comuns é por um motivo: provavelmente refletem algo verdadeiro. Seria autoritário eu cravar aqui o que a mulher deve ou não fazer. Arrogante, também, seria dizer que não, a mulher não tem o direito de fazer o que quiser com o seu corpo. Tudo isso é verdade, e talvez por isso, penso que sim, a descriminalização do aborto é uma pauta importante e que precisa ser debatida. Por mulheres, sobretudo.


Muitos aspectos são considerados quando falamos de aborto. Crenças, segurança, saúde, direitos… Por mais complexo que alinhar todas estas questões sejam, há um processo de maturação da ideia. Acredito que no futuro o aborto será, sim, descriminalizado. Infelizmente, o mesmo Brasil que foi o último a “acabar com a escravidão”, tende a ser um dos últimos, também, a dar o direito que a mulher tem sobre seu próprio corpo.


Com o aumento da laicidade do Estado, é observável que juridicamente falando a possibilidade do aborto tem ganho espaço. “O tratamento jurídico reservado ao corpo humano sofreu, ao longo da história, profunda influência do pensamento religioso. Visto, por muitos séculos, como uma dádiva divina, o corpo humano era considerado como merecedor de uma proteção superior aos desígnios individuais. O pensamento moderno rompeu com essa perspectiva, recolocando gradativamente a integridade corporal no campo da autonomia do sujeito‟. (SCHREIBER, Anderson. Direitos da personalidade. São Paulo, Atlas, 2011, p. 32). Ainda no âmbito jurídico, o abortamento é realizado legalmente quando: “se não há outro meio de salvar a vida da gestante”, “anencefalia fetal”, e “ se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”. Nem sempre foi assim, e, essa reforma gradativa na interpretação dos direitos da mulher demonstram que, aos poucos, as coisas tendem a caminhar para a descriminalização do aborto.


Até porque a criminalização do aborto não diminui ou impede a realização dele. Haja vista os números de abortos realizados no país elencados em recente reportagem no site Gizmodo. Segundo a Pesquisa Nacional de Aborto, realizada pelo Anis (Instituto de Bioética), entre 2010 e 2016, foram registrados cerca de 500 mil abortos em cada ano. Gerando, dessa forma, um custo para os cofres públicos, uma vez que cerca de 250 mil mulheres ocupam leitos do SUS por conta da prática mal sucedida. De acordo com o divulgado pelo G1 em 2020, o número de procedimentos como curetagem e aspiração realizados através do SUS em quem praticou abortos espontâneos e provocados, foi 79 vezes maior que os feitos em quem praticou aborto legalmente.


Acredito que, sinceramente, se o número de abortos vai aumentar ou não com a descriminalização do procedimento, pouco importa. Isso diz respeito somente à gestante e aos familiares. É uma ação pessoal. Quem quer realizar o abortamento já o faz, porém, sem nenhuma segurança. É algo que deve partir da gestante fazê-lo ou não, e é um direito individual de cada pessoa. Se humanitariamente não é possível que você imprima empatia por estas mulheres, vejamos sob outra perspectiva. Observemos, então, sob a ótica financeira: Abortos ilegais aumentam o custo de operação do Sistema Único de Saúde.


A descriminalização do aborto deixou de ser uma questão interferível pelo Estado. Quem quer, vai lá e faz. Criminalizar apenas precariza o serviço, que poderia e deveria ser muito mais seguro para nossas mulheres. Exigir a manutenção do status quo é apenas para manifestar o desprezo com a vida alheia.


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